O mercado da moda dita quase que diariamente novas tendências, modas sazonais e produz novas coleções que alimentam o consumo desenfreado. A cada dia é maior e desmedido o consumo do fast fashion (moda rápida). Segundo dados do Instituto de Estudos e Marketing Industrial (IEMI), a produção de roupas, meias e acessórios no Brasil alcançou 6,4 bilhões de peças em 2010.
Já parou para pensar onde e como foi produzida, quem são as pessoas envolvidas na fabricação e quais são os impactos de cada peça que compramos?
Os impactos decorrentes da produção percorrem toda a cadeia produtiva têxtil: desde o plantio do algodão até a confecção da peça (etapa final), além dos impactos derivados da comercialização. O cultivo do algodão, em virtude da grande quantidade de pesticidas, inseticidas e fertilizantes empregados para a obtenção da fibra, causa contaminação da água, do solo e da fauna local. Além de consumir um volume gigantesco de água nos processos de beneficiamento e acabamento (alvejar e tingir produtos têxteis). Ao longo da cadeia produtiva têxtil, os impactos ambientais envolvem contaminação do solo, consumo de água, de energia, emissões atmosféricas de poluentes e resíduos sólidos. No aspecto social – e também sustentável – que muitas vezes envolve o grave problema da mão de obra explorada de maneira análoga ao trabalho escravo, infelizmente uma prática muito presente inclusive na produção de grandes cadeias de lojas e marcas que terceirizam a produção e a responsabilidade sobre a questão.
Em relação à última etapa, a confecção, os retalhos causam um impacto altamente significativo e não perceptível. No Brasil, a estimativa de resíduos têxteis é da ordem de 175 mil toneladas/ano. Desse total, apenas 36 mil toneladas são reaproveitadas na produção de barbantes, mantas, novas peças de roupas e fios (TURCI, 2012). Segundo dados da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e Confecção (ABIT) na região do Bom Retiro, diariamente são descartados inadequadamente 12 toneladas de resíduos têxteis (retalhos) produzidos por mais de 1,2 mil confecções. A coleta dos retalhos é realizada de forma desorganizada, sem preocupação com a destinação adequada.
Cada peça produzida inevitavelmente gera aparas e retalhos que atualmente são descartados no lixo comum. Segundo estimativa do Programa da Organização das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), o volume de resíduos urbanos deve aumentar do atual 1,3 bilhão de toneladas para 2,2 bilhões de toneladas até 2025. Em relação ao descarte do lixo no Brasil, apenas 58% do total coletado tem como destino os aterros sanitários, terrenos que funcionam de acordo com as exigências legais. O restante é despejado em aterros controlados (24,2%) e em lixões (17,8%), e somente cerca de 4% é reciclado. Visando o gerenciamento dos artigos têxteis advindos do descarte doméstico e dos resíduos gerados nos processos de fabricação, a reutilização de retalhos como matéria-prima surge como uma resposta emergencial aos problemas ambientais, como o saturamento dos aterros sanitários e de descarte inadequado do setor. O setor têxtil até então não se preocupava em traçar um caminho de volta, isto é, para onde e por quem são levados os seus resíduos.
A lei nº 12.305 de agosto de 2010 instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) com a finalidade de regulamentar o tratamento ou disposição de resíduos de maneira adequada para minimizar o impacto ambiental. De acordo com a classificação de resíduos sólidos dada pela Norma NBR 10004:2004 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), os retalhos se enquadram em Resíduos Classe II A – Não inertes, que possuem propriedades como biodegradabilidade, combustibilidade ou solubilidade em água. A lei estabelece a eliminação de lixões e consequentemente a disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos até 2014. Dessa forma, as empresas que geram resíduos devem adotar mudanças na sua cultura relacionadas às práticas de destinação dos resíduos visando prevenir danos ambientais causados por seus processos produtivos.
Diante desse cenário, uma das possibilidades para evitar a destinação inadequada dos retalhos é a reciclagem de tecidos, que consiste no processo de reutilizar as sobras de aparas (retalhos) e transformá-las em fios. Por meio de processos industriais, os fios podem ser usados para a fabricação de novos tecidos, estopas, colchões, mobiliários. A Consultoria Ambiental Escolha Verde é uma empresa incubada desde 2012 no Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologia (Cietec), localizada na Incubadora de Empresas de São Paulo USP-IPEN, na Cidade Universitária. A consultoria oferece entre seus serviços a análise da cadeia produtiva do segmento têxtil, estabelecendo práticas mais sustentáveis dentro dos seus processos. Atua também no desenvolvimento de alternativas e soluções para o descarte dos resíduos têxteis e também resíduos indiretamente relacionados, presentes em vários setores, como por exemplo, a indústria automobilística – cerca de 45% dos materiais no interior dos automóveis é composto de produtos têxteis, como retalhos para estofamentos, cintos de segurança e carpetes. As alternativas e soluções têm como objetivo minimizar os impactos socioambientais e agregar valor de mercado aos resíduos. Atualmente a sociedade produz mais do que necessita consumir, gerando um grande excedente, e como consequências dessas ações temos o esgotamento de recursos naturais e a geração de lixo e poluição. Em contrapartida, chegamos a tal ponto de desenvolvimento tecnológico que hoje já conseguimos produzir de forma mais limpa, gerando menos impactos. Dessa forma, são necessários maiores esforços e investimentos com retorno a curto, médio e longo prazo. A gestão dos resíduos oriundos do setor têxtil é imprescindível, tanto do ponto de vista ambiental, social, legal e econômico para a consolidação de uma sociedade mais sustentável em diversos níveis. Toda a população mundial consome e utiliza produtos têxteis diariamente, uma mudança efetiva nesta área pode gerar um grande impacto positivo.
Beatriz Couto | Gaby Degaki – sócias da Consultoria Ambiental Escolha Verde
Gestoras Ambientais formadas pelo Centro Universitário Senac
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